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Produtor Rural

Novas políticas para o campo podem comprometer direitos de trabalhadores rurais

Renato Maluf, economista e professor, foi presidente do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão bipartite fala sobre o debate para a situação atual das políticas no campo, com as mudanças que estão sendo requeridas pelo governo interino

Novas políticas para o campo podem comprometer direitos de trabalhadores rurais

Imagem: Reprodução/G1

Renato Maluf, economista e professor, foi presidente do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão bipartite – governo e sociedade civil, com a sociedade civil na presidência — fala sobre o debate para a situação atual das políticas no campo, com as mudanças que estão sendo requeridas pelo governo interino. Maluf aponta riscos de perda de alguns direitos adquiridos pelos pequenos produtores rurais. Como vocês vão perceber na leitura, está tudo interligado.

Numa palestra recente sobre dilemas e perspectivas dos setores agrário e agrícola, parte de uma série de ações do movimento que exige a não extinção do Ministério de Desenvolvimento Agrário, o senhor falou sobre o desmonte – feito pelo governo interino – de políticas públicas voltadas ao campo. Pode explicar melhor?

Renato Maluf – Há um acirramento do conflito no entorno dos destinos do meio rural brasileiro. De um lado, o golpe está fortalecendo posições tanto oriundas do que eu chamo de intelectuais orgânicos do agronegócio – pessoal da academia e institutos de pesquisa – quanto da bancada ruralista. Eles têm pautas muito parecidas em alguns pontos, como o questionamento sobre a diferenciação entre políticas sociais destinadas às famílias rurais mais pobres – que eles desconsideram como produtores – e agricultores. Querem que os mais pobres sejam levados para o Ministério do Desenvolvimento Social. Nessa visão, tem um percentual enorme de famílias rurais que devem ser tratadas simplesmente como pobres, não como agricultores.

Qual o enfoque desse tipo de proposta?

Renato Maluf – É um enfoque produtivista, embora eles tentem usar outra noção, chamando de intensificação sustentável. Todos pleiteiam o mesmo tipo de revisão da legislação trabalhista do campo, o que quase sempre significa comprometimento de direitos. No caso da bancada ruralista, eles já estão pleiteando isso há muito tempo, para revisar toda a desapropriação de terra e atribuição de terras a indígenas e quilombolas. Isso passaria a ser atribuição do Congresso.

Isso é considerado pelos movimentos socioambientais como um enorme retrocesso…

Renato Maluf – Sim, mas é preciso dizer, a bem da verdade, que o agronegócio nunca esteve pressionado ou comprometido, nem pelo governo Lula, nem pelo governo Dilma Rousseff. Ambos sempre trataram esse setor com apoio porque acreditam nessa estratégia, no papel econômico das exportações de commodities, o que sempre foi objeto de crítica nosso. O que estou dizendo é que agora, com as políticas atuais, essa hegemonia se consagra. Pior do que isso: os direitos duramente construídos para esses agricultores, populações tradicionais, indígenas, mulheres do campo, trabalhadores, assalariados, provavelmente vão ser gradativamente mais comprometidos.

Sem direitos, cada vez mais eles precisarão do apoio do estado…

Renato Maluf – Mas não terão, porque a orientação conservadora direitista do governo interino é nítida, eles nem escondem. O Brasil tinha uma experiência inédita no mundo, ou seja, dois ministérios para lidar com a agricultura, mantendo uma política diferenciada para atender o social no campo. Muitos países estavam começando a seguir esse exemplo, inclusive. O que esse governo está propondo é acabar com isso. E já começou, com essa negociação escusa que foi feita com o Paulinho da Força Sindical que levou a estrutura do MDA para a Casa Civil. Isto é, obviamente, uma solução intermediária para levar para o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária, Abastecimento).

A agricultura familiar brasileira sempre teve um papel importante no cenário internacional, não? Isso pode acabar?

Renato Maluf – Sim, nós temos uma agricultura familiar que ainda é bastante significativa e ainda desempenha papel importante na nossa alimentação. Na maioria dos produtos que a gente consome há uma presença da agricultura familiar. Só que ela está se transformando, não necessariamente numa boa direção. E o que eles pretendem fazer é reforçar essa transformação do pequeno agricultor familiar numa direção de uma agricultura mais produtiva que as pessoas chamam, jocosamente, de agronegocinho. É empurrar a agricultura familiar nessa direção de modelos produtivistas mecanizados intensivos, com uso de pesticidas. Aliás, eles não gostam nem que se chame de agrotóxico, querem que se elimine essa expressão para chamar de defensivos. A linguagem tem muitos significados, até aí vai a disputa.

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