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Entrevista Exclusiva

"A tecnologia está fornecendo vantagens importantes para a produção de proteína animal"

A diretora de Parcerias Estratégicas de Agricultura da Microsoft, Claudia Röessler, fala com exclusividade sobre o impacto das tecnologias digitais em sistemas produtivos agroalimentares, desafios e a atuação da empresa no mundo agro

"A tecnologia está fornecendo vantagens importantes para a produção de proteína animal"

Claudia Rössler, diretora de Parcerias Estratégicas de Agricultura da MicrosoftAs tecnologias digitais estão transformando por completo o agronegócio, com uma série de inovações importantes oferecendo soluções aos principais desafios dentro da cadeia produtiva, seja relacionado a práticas produtivas ou demanda dos consumidores, assim como da própria gestão das propriedades rurais.

A redação de Avicultura Industrial e Suinocultura Industrial conversou com exclusividade com a diretora de Parcerias Estratégicas de Agricultura da Microsoft, Claudia Röessler, sobre as mudanças propostas pela tecnologia no campo e a atuação da companhia dentro do setor agro.

Claudia Rössler é diretora de Agricultura na Engenharia Global do Microsoft Azure, sendo responsável pelo desenvolvimento de parcerias estratégicas para inovação digital e tecnologia em agricultura e alimentos. A executiva ingressou na Microsoft em 1992 em Munique, Alemanha. Sua carreira está focada em Soluções Industriais e Desenvolvimento de Negócios. Em funções de liderança internacional, assumiu várias áreas, incluindo Desenvolvimento de Negócios, Estratégia e Operações, Vendas e Marketing e Engenharia.

A diretora de Parcerias Estratégicas de Agricultura da Microsoft é uma das palestrantes do evento Animal AgTech South America Summit, que ocorre de maneira virtual nos dias 30 de junho e 01 de julho de 2021. Confira a entrevista na íntegra.

 

AI/SI – A América do Sul, principalmente o Brasil, possui sistemas intensivos de produção de proteína animal com grande e  número de animais alojados. Como a tecnologia irá contribuir para o gerenciamento destas produções, seja em termos produtivos e/ou econômicos?

Claudia Rössler – A tecnologia está fornecendo algumas vantagens importantes para a produção de proteína animal, por exemplo, a capacidade de operar um “ambiente controlado”, que pode ser monitorado 24 horas por dia, 7 dias por semana, usando sensores e câmeras. Os sensores estão “no ponto” 24 horas por dia, 7 dias por semana, onde quer que sejam necessários e superam a capacidade humana de monitorar e inspecionar. Por exemplo, câmeras ou sensores em celeiros podem alertar sobre o estresse dos animais, riscos ambientais ou condições insalubres. Grandes áreas podem ser monitoradas por sensoriamento remoto. Os exemplos incluem o monitoramento de rebanhos por meio de drones ou satélite para segurança e contra roubo. Esses sensores estão cada vez mais avançados e monitoram temperatura, umidade, vibrações ou mesmo níveis de estresse – indicadores que sinalizam uma ameaça potencial, condições de saúde ou graves riscos ambientais.

 

AI/SI – A coleta destes dados possibilita uma predição, e uma ação antes que uma determinada situação aconteça?

Claudia Rössler – Quanto mais dados e variedade de dados são coletados, mais permitem correlacionar tais fatores prevendo riscos e desafios, que podem ser enfrentados antes que aconteçam. Quanto mais você rastrear informações em tempo real e começar a correlacionar que tipo de tratamento levou a qual resultado, você estará obtendo o valor real da análise e do ML, que é “aprender” e “melhorar” com base em ciclos de feedback digital fechados. Por exemplo, se você deseja rastrear o impacto da alimentação e nutrição na produtividade animal, você também pode rastrear todos os fatores relacionados para que possa descobrir correlações, que são difíceis de observar de outra forma. Isso vai tão longe, que você pode criar um “gêmeo digital” de sua produção animal, rebanho, celeiro ou animal. Um gêmeo digital é um modelo digital do mundo físico para objetos físicos e nos permite monitorar as condições e prever os problemas antes que eles aconteçam com base no monitoramento de uma ampla gama de dados relevantes que afetam o desempenho. Gêmeos digitais são amplamente usados para melhorar. Em última análise, vejo o papel da tecnologia em ajudar a tomar melhores decisões.

 

AI/SI – O bem-estar animal é atualmente um tema muito importante para o consumidor e para o setor produtivo animal. As tecnologias conseguem estabelecer parâmetros de bem-estar animal, proporcionando ao consumidor garantias de que o animal foi criado dentro destes parâmetros?

Claudia Rössler – Deixe-me tentar responder a essa pergunta de maneira sequencial. É possível criar transparência na cadeia de abastecimento alimentar e acompanhar a jornada da “grama ao vidro”, do “pasto ao prato”? Absolutamente sim. Vemos que existe uma motivação cada vez maior para criar essa transparência, não só na perspectiva do bem-estar animal, mas também para responder às preocupações com a produção sustentável, qualidade/segurança alimentar, proveniência ou para dar transparência às práticas éticas. Existem padrões comuns sobre práticas de bem-estar animal, dados ou padrões de rastreamento ou uma forma unificada de rotulagem inteligente? Não. O consumidor está disposto a pagar a mais pela transparência? Depende. No período do ano passado – também impactado pela pandemia e pelo fato de os consumidores estarem gastando mais tempo na aquisição e preparação de alimentos – vimos uma maior conscientização e pedido de transparência. No mundo desenvolvido, esperamos que os consumidores peçam para tomar decisões mais informadas com base em rótulos inteligentes e uma maior consciência de que essa transparência aumenta o custo do produto e pode exigir um preço Premium. Uma evidência é o crescente interesse em tecnologia que permite a visibilidade da cadeia de suprimentos, rastreabilidade e verificação digital.

 

AI/SI – Há projetos que visem a integração de tecnologias em plataformas únicas, evitando assim a fragmentação destas ferramentas, facilitando assim a vida do produtor?

Claudia Rössler – Integração e agregação são aspectos importantes para conceitos de tecnologia de sucesso. Integração significa a capacidade de diferentes sistemas de se comunicarem com outro. E a agregação é a capacidade de coletar dados sobre várias fazendas, regiões ou diferentes raças de animais. A capacidade de raciocinar sobre mais dados é um aspecto importante no desenvolvimento de modelos científicos e agronômicos robustos. Como Microsoft, queríamos desempenhar um papel na habilitação da coleta de dados contínua – não importa qual fonte de dados é necessária e ajudar as organizações que desejam construir modelos e percepções para a agricultura. Desenvolvemos a plataforma FarmBeats, que assume o trabalho pesado de organizar, limpar e preparar dados para análises geoespaciais. Dados agrícolas, como dados de satélite, clima e equipamentos, são retirados de seus silos e colocados em uma plataforma comum. A plataforma fornece um modelo de dados, um armazenamento de dados espaciais e temporais e vários modelos de dados básicos que permitem um desenvolvimento rápido e eficaz de soluções agronômicas, como pulverização de precisão, colocação de sementes, monitoramento de campo ou análise de rendimento no topo.

 

AI/SI – Outras tecnologias também desempenham um papel significativo para a indústria de alimentos, animais e nutrição?

Claudia Rössler – A tecnologia IoT e Digital Twin desempenham um papel significativo na capacitação da indústria de Alimentos, Animais e Nutrição. Um aspecto importante é trazer a “inteligência” para o limite – significa trazer mais processamento de dados no dispositivo IOT real na fazenda, no celeiro ou no animal. Um dos primeiros a adotar FarmBeats foi Land O’Lakes – uma cooperativa agrícola de propriedade de membros com foco em laticínios. Eles estão usando o FarmBeats para construir uma plataforma agtech conectada que reunirá os portfólios da Land O’Lakes (como o R7 Suite, Data Silo e Truterra do WinField United) em uma arquitetura unificada. Eles também estão trabalhando em uma solução de laticínios digital que permitirá a rastreabilidade em toda a cadeia de abastecimento da Land O’Lakes, proporcionando transparência e garantindo a confiança do consumidor de que os alimentos são da mais alta qualidade e de origem sustentável.

 

AI/SI – O produtor tem se mostrado aberto a adoção de uma propriedade completamente digitalizada? Ele tem compreendido e aderido a esta transformação no campo?

Claudia Rössler – A automação não é nova para a indústria pecuária. Então, eu diria que há uma abertura geral para inovação e tecnologia. Existem mais requisitos em torno de conformidade, relatórios ambientais, segurança na produção de alimentos, mais variedade de produtos, lotes de produção menores, uma nova necessidade de transparência do consumidor – tudo isso vai impulsionar a necessidade de tecnologia e análises. Mas é um longo caminho para uma digitalização completa e isso pode não ser necessariamente a melhor opção para todos os produtores. Trata-se de escolher cuidadosamente a tecnologia que tem o maior impacto na eficiência econômica e talvez fazer parceria com um agregador de dados, como uma cooperativa agrícola, um provedor de alimentos, um instituto financeiro que fornece insights com base em conjuntos de dados agregados, que ajudam a otimizar o retorno do investimento em tecnologia.

 

AI/SI – A digitalização de uma propriedade rural traz maior eficiência econômica ao produtor? Ele consegue avaliar se o investimento em digitalização é uma aposta viável para ele?

Claudia Rössler – A tecnologia é usada de muitas maneiras: Qual é a ingestão nutricional ideal para um crescimento ideal? Posso prevenir o risco de doença? Roubo? ou estresse animal? Otimizar o custo de minhas operações? Economize energia ou água? Existe um risco de qualidade ou segurança alimentar na minha produção? Qual é a demanda/preço do mercado? Como esses desafios são tão diferentes, é difícil fazer uma declaração ampla quando a digitalização é viável para um produtor. O retorno do investimento certamente depende do desafio, do tipo de animais de fazenda, do tamanho da operação e em que parte da cadeia de valor você está inserido. Dito isso, vejo uma grande oportunidade para os produtores, que ainda não estão prontos para investir em tecnologia em suas próprias operações para procurar esses agregadores, que fornecem serviços de dados e análises ou combinam seu produto com serviços. Essas organizações podem fornecer uma visão analítica ou um prêmio em troca de um produtor compartilhar dados e uma visão sobre suas práticas – por exemplo, um produtor poderia obter melhores condições de empréstimo ou seguro, se eles compartilhassem dados com sua instituição financeira.

 

AI/SI – Como o Microsoft Azure atua de forma a agregar tecnologias em benefício ao produtor rural? E, a Microsoft dispõe de ferramentas específicas para o produtor no campo e/ou para indústria de alimentos?

Claudia Rössler – Vemos o papel da Microsoft na agricultura como facilitador. Estamos construindo tecnologia de plataforma, que está simplificando significativamente a criação de aplicativos digitais, o desenvolvimento de soluções analíticas e o gerenciamento de dispositivos IoT. Também estamos trabalhando com startups da AgTech, bem como organizações comerciais, como em saúde e nutrição animal, processadores de alimentos, varejistas, serviços de alimentação, seguros e bancos, bem como pesquisadores, universidades e entidades governamentais. Todos estes desempenhando um papel significativo em impulsionar e financiar a inovação para a indústria, como agregadores de dados e como fornecedores de soluções analíticas para o produtor. Esses parceiros são mais adequados para entender os desafios dos produtores e abordar vários desafios tecnológicos para nós, que vão desde necessidades em torno da saúde e nutrição animal, produção sustentável, produtividade, qualidade e segurança alimentar, previsão de demanda e gerenciamento de problemas da cadeia de abastecimento – e, finalmente, compreensão do microbioma – são tudo dependente da velocidade da inovação, do avanço da tecnologia e da confiabilidade dos dados e análises.

 

AI/SI – Em que áreas específicas a Microsoft tem investido na área agrícola?

Claudia Rössler – A Microsoft está fazendo investimentos na agricultura nos seguintes aspectos: • Tecnologia – desenvolvimento de plataformas de tecnologia, como FarmBeats, que constroem uma base para o desenvolvimento de software/aplicativo em agricultura e alimentos. • Inovação – parcerias e iniciativas de pesquisa, como AI for Earth, que aceleram o desenvolvimento de métodos analíticos inovadores, conjuntos de dados compartilhados e modelos de Inteligência Artificial e aprendizado de máquina. • Infraestrutura – muito trabalho é necessário para levar tecnologia à agricultura rural. E as equipes de Corporate Affairs & Philanthropies da Microsoft estão constantemente trabalhando na criação da infraestrutura central para conectividade, capacitação digital, trabalhando para informar as políticas e fazendo parceria com parceiros locais para apoiar iniciativas específicas do país ou região. • Parcerias – acelerando o trabalho com startups por meio do programa “Microsoft para Startups”. Além de parcerias altamente estratégicas, como o apoio da Microsoft ao trabalho do IICA (Interamericano) para a construção de um Centro Interpretativo da Agricultura do Amanhã (CIMAG), um espaço educacional online que chama a atenção para o papel fundamental que as novas tecnologias estão desempenhando no setor agrícola, e como eles impactam o bem-estar das famílias de moradores rurais e urbanos. Continuamos investindo nessas iniciativas que tornam a tecnologia acessível e relevante tanto para grandes produtores quanto para a agricultura rural.

 

AI/SI – Na América do Sul há diversas áreas rurais com baixa conectividade, isso é possível de ser superado de alguma forma com estas novas tecnologias?

Claudia Rössler – A conectividade é a base para participar da inovação tecnológica. A conectividade com a Internet é tão baixa quanto 23% nas residências rurais. E em alguns países, como Bolívia, El Salvador, Paraguai e Peru, mais de 90% dos domicílios rurais não têm conexão com a internet. A Microsoft fez parceria com o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) em uma visão abrangente da situação da conectividade rural na região, revelando que 71% da população urbana da América Latina e o Caribe têm opções de conectividade, em comparação com apenas 37% de suas contrapartes nas áreas rurais, o que é uma lacuna de 34 pontos percentuais que mina o imenso potencial social, econômico e produtivo deste último. A Airband Initiative da Microsoft visa eliminar a exclusão digital e levar conectividade de alta velocidade à internet para comunidades não conectadas. Em 2017, eles lançaram uma iniciativa para levar conectividade à Internet para 40 milhões de pessoas em todo o mundo até 2022. A banda aérea aproveita o espaço em branco da TV (TVWS) – as frequências de transmissão não utilizadas entre os canais de televisão. O TVWS é mais barato e rápido de implantar em comparação com a fibra tradicional e pode viajar longas distâncias e transmitir através de terreno florestal. Um grande exemplo é uma parceria com a Lavazza, uma torrefação italiana de café, o Ministério das TICs, a Agência Nacional do Espectro e a Microsoft em 2017 para apoiar 100 famílias de cafeicultores nos municípios de Lejanías, Mesetas e San Juan de Arama, no departamento de Meta, na implantação de um sistema sustentável de produção de café baseado na apropriação das TICs pelos cafeicultores da região. A qualidade dos produtos dessas comunidades aumentou em 52%, eles se adaptaram aos padrões internacionais e essas famílias puderam utilizar conteúdos educacionais, culturais, de saúde e qualidade de vida que antes não tinham acesso.