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Economia

Incertezas prejudicam investimentos no Brasil em infraestrutura

As iniciativas para estimular os investimentos privados em infraestrutura correm o risco de não serem bem sucedidas, já que os modelos de concessão sujeitam o investidor aos caprichos discricionários do poder estatal.

Incertezas prejudicam investimentos no Brasil em infraestrutura

Estudo realizado por Sérgio Lazzarini, professor do Insper, e pela assistente de pesquisa Camila Bravo Caldeira, aponta que o valor de mercado das ações das empresas de setores que sofreram algum tipo de intervenção do governo federal – telecomunicações, bancos e setor elétrico – diminuiu cerca de R$ 61 bilhões desde o início do ano, com quedas muito superiores às do Ibovespa. Com tais números, não é de se surpreender com a anemia dos investimentos na economia brasileira, notadamente em setores de infraestrutura que dependem da existência de adequado ambiente regulatório e de segurança jurídica. Como se sabe, nas contas nacionais, já por quatro trimestres consecutivos, o crescimento da Formação Bruta de Capital Fixo se mostra negativo, tendência que deve ser mantida pelo menos por mais um trimestre.

Uma das características do governo da presidente Dilma Rousseff é a sua hiperatividade regulatória, por meio da adoção continuada – e nem sempre coerente – de medidas administrativas e tributárias que afetam a taxa de retorno esperada pelos investidores em determinados setores de atividade. Em muitos casos, tais ações incrementam o retorno das empresas em certos mercados, mas em detrimento de outros setores, cujo desempenho esperado é variável fundamental na determinação dos investimentos futuros. Essa política em “patchwork” acarreta distorções microeconômicas que, em algum momento, inevitavelmente terão que ser tratadas com novas intervenções oficiais, gerando círculo vicioso que eleva em espiral as incertezas dos agentes econômicos, com graves e persistentes prejuízos para o investimento.

A título de exemplo, tomemos em consideração as recentes medidas do governo no mercado de energia elétrica. A ideia de redução do custo da energia elétrica é, sem dúvida, positiva para o aumento da competitividade da economia brasileira. Ocorre que a renovação antecipada e condicionada das concessões com redução das tarifas de energia, se não desrespeita a letra dos contratos, contraria a expectativa de receitas futuras das concessionárias, o que está levando algumas delas a não aderir à proposta. Esse fato, por si só, vem afetando a percepção dos investidores quanto ao risco de novas medidas que prejudiquem as empresas do setor, principalmente se o governo não lograr voluntariamente a redução pretendida nas tarifas. O dano sobre as expectativas é tamanho que prejudica até a captação de renda fixa pelas companhias do setor, como noticiou este jornal em manchete de primeira página na edição da última segunda feira (“Nova regra afeta captação de debêntures de elétricas”).
 
Quanto ao segmento das telecomunicações, o discurso agressivo e recheado de ameaças do governo com relação às empresas de telefonia celular igualmente derrubou as ações do setor e vem se constituindo em ameaça para os investimentos em 4G. O estranhável não foi a ação concreta da Anatel para assegurar o cumprimento da qualidade de atendimento pelas companhias, mas sim o uso agressivo da “regulação sob ameaça”, caminho totalmente ineficiente e contraproducente de atuação por uma instituição reguladora, isso sem contar o prejuízo causado pela cacofonia das declarações desencontradas das autoridades envolvidas no assunto. A propósito, o mais escabroso foi a acusação pela imprensa a uma operadora de estar deliberadamente derrubando as ligações de seus clientes para aumentar seu faturamento. Se verdadeira tal prática – que não ficou comprovada – deveria ela ter merecido exemplar sanção por parte da Anatel, jamais acusações inconsequentes no que pareceu mais ter sido tão somente um “jogo para a plateia”.

Além disso, a própria gestão macroeconômica adiciona maiores preocupações aos investidores. Os controles dos fluxos de capitais externos são, por exemplo, um típico de caso de política considerada “unfriendly” pelo mercado. Seu caráter discricionário e a permanente ameaça que tal política representa sobre os fluxos de caixa futuros dos investimentos acabam por elevar o risco país sob a ótica dos investidores, seja no mercado bursátil ou não. Neste caso também, o uso abusivo de ameaças verbais de novas restrições cobra seu preço, pois trazem insegurança aos investidores estrangeiros com relação à liquidez futura de suas inversões.

Em conclusão, o excesso de intervenção do governo tem contribuído para derrubar o investimento, num contexto já difícil por conta das deficiências de infraestrutura, elevados custos laborais e baixa produtividade. Por sua vez, as iniciativas para estimular os investimentos privados em infraestrutura correm o risco de não serem bem-sucedidas, já que os modelos de concessão mantêm sob o controle do Estado os aspectos mais importantes do negócio, sujeitando o investidor aos caprichos discricionários do poder estatal. Nessa situação, infelizmente torna-se cada vez mais difícil para o Brasil sair da armadilha do baixo crescimento nos próximos anos.

Gustavo Loyola, doutor em economia pela EPGE/FGV, foi presidente do Banco Central e é sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo. [email protected]